A campanha foi idealizada por Caio Sena e Ana Carolina Fernandes, donos da página “Pretitudes”, no Instagram, que decidiram se movimentar para ajudar alguns dos 300 mil estudantes que não efetuaram o pagamento da inscrição do Enem.

A página lançou uma campanha nas redes sociais e pediu que pessoas de baixa renda preenchessem um formulário, ao mesmo tempo em que incentivou a doação em dinheiro por parte de voluntários.

Ao fim da campanha, foi arrecadada uma quantia em torno de R$ 50 mil reais, que seria suficiente para realizar a inscrição de cerca de 600 mil estudantes.

Os donos da página, então, decidiram que, além de quitar a inscrição de 275 estudantes, vão pagar para eles um curso pré-vestibular online, como conta Caio Sena.

“Nossa perspectiva principal é ajudar estudantes de baixa renda. O governo divulgou que mais de 300 mil estudantes não conseguiram pagar seus boletos. Ele [o governo] não explicou os motivos, mas deixa aberto que foi por conta da queda de rendimento, desemprego, por conta da pandemia”, afirmou.

“Se a gente pagasse só taxas do Enem, a gente conseguiria ajudar em torno de 600 mil estudantes. Não tenho esse percentual agora. Mas a gente vai pagar 275 taxas de estudantes e 275 pré-vestibulares”, relatou.

A iniciativa é semelhante a outra realizada pela publicitária cearense Lyara Vidal, a “Pretos no Enem”, mas elas não estão conectadas.

Depois de quitar a inscrição dos estudantes, Caio e Ana Carolina vão passar um pente fino nos dados dos estudantes para confirmar que eles se encaixam no perfil desejado.

“Em nosso formulário, é preciso que a pessoa seja de baixa renda e, de fato, esteja necessitando, porque o boleto está aberto. A gente paga esse boleto. Para o pré-vestibular, a gente vai dar uma filtrada melhor, para que sejam incluídos apenas estudantes de baixa renda. A gente vai pedir, preferencialmente, o Cadastro Único de inscrição no Governo Federal”, afirmou.

A página é de Salvador, entretanto, ao todo, pessoas de 22 estados foram contempladas com a campanha. É o caso de Isabela Cruz, do município de Ibicaraí, na Bahia. Aos 27 anos, ela perdeu o emprego no salão de beleza onde trabalhava sem carteira assinada e não conseguiria realizar a inscrição.

“A gente está passando por uma situação grave. Infelizmente, a situação econômica está muito difícil. Na minha casa são sete pessoas, e o dinheiro que a gente recebeu foi apenas para suprir as necessidades básicas. Eu não tinha como pagar a minha taxa de inscrição”, afirmou.

Com o sonho de cursar Medicina, ela conta que ficou empolgada quando soube que também teria direito a um curso pré-vestibular.

“Eu amei. Eu tinha planos de começar a estudar por ele (curso online). Tinha colocado na lista de desejos, mas não ia conseguir. Fiquei muito feliz”, disse.

Da Bahia para o Rio de Janeiro, outra contemplada foi Daiana de Barros Silva, de 30 anos. Moradora do município de São Gonçalo, ela trabalhava em um restaurante e, depois da pandemia, foi demitida.

Sem renda, não conseguiu pagar o aluguel e precisou voltar para a casa do pai com os dois filhos, um de 13 e outra de 9 anos.

“Minha vida se desestruturou completamente. Eu morava sozinha com meus filhos e precisei entregar a minha casa, porque não consegui mais pagar o aluguel. Estou morando meio que de favor com meu pai, porque não tenho mais idade para viver dessa forma”, afirmou”, disse.

Daiana conta que ainda está processando a informação sobre o curso pré-vestibular a que também terá direito.

“Eu me senti abençoada, porque é uma oportunidade a mais para ingressar no nosso sonho. Ainda estou meio anestesiada, sem acreditar. Estou muito feliz”, afirmou.

“O Enem é um projeto muito importante, principalmente para nós negros, que muitas vezes não têm espaço na sociedade. O Enem é uma forma de conseguir um espaço estudando”, avaliou.

A página Pretitudes trata de questões raciais. No início, Caio Sena e Ana Carolina apenas replicavam textos e informações sobre o assunto, mas hoje produzem conteúdo próprio.

Devido aos protestos antirracistas que acontecem ao redor do mundo, sobretudo depois do assassinato do americano George Floyd por um policial branco, a página passou a ser divulgada por muitas pessoas, inclusive famosos, e ganhou 100 mil seguidores em uma semana.

Hoje, depois de atingir a marca de 240 mil seguidores, são cinco pessoas para gerenciar o material produzido pela página.